Quando olhamos para as imagens de Gaspar Gasparian o que mais nos surpreende é a facilidade com a qual ele passeia pelas mais variadas linguagens e idéias. Livre de amarras ou pré-conceitos quanto à forma de fotografar ele se permite explorar, buscar e trazer para suas fotografias um sopro de novidade, de surpresa.

Quando ele nasceu em 1899 a fotografia já discutia seu estatuto de arte autônoma dentro da história. Os foto-clubes já existiam na Europa.

Quando ele iniciou na fotografia por volta de 1940, esta situação também já estava bem definida no Brasil. Aliás, ele próprio ingressou num foto cine clube, o Bandeirante, aqui em São Paulo.

No começo seu trabalho marcado pelas leis do pictorialismo, das naturezas mortas, dos temas naïf da época, mas poucos anos depois, percebeu que a fotografia era muito mais do que a repetição bucólica que em muito lembrava a academia de belas artes e partiu para as experimentações.

Com colegas como Geraldo de Barros, Eduardo Salvatore, Ademar Manarini, German Lorca e Thomaz Farkas trouxe novos ares para a linguagem fotográfica passando do clássico para o moderno. Aliás, este grupo de desbravadores passou a ser denominado pela crítica da época como os fundadores da "escola paulista da fotografia".

Seus trabalhos nos parecem pequenas brincadeiras, no que esta palavra tem de melhor. Como se aos olhos de um menino suas construções fossem desvendando seu imaginário. Seu olhar viajante é o do observador. Talvez uma forma de libertar o empresário respeitado e de sucesso e trazer à tona seus talentos e suas vontades artísticas. Curioso, ele se posiciona, procura um olhar diferenciado, nos mostra cidades e ruas que foram apreendidas com todos os seus sentidos. Como se estivéssemos passeando com ele pelos lugares por onde passou. Nas fotografias da cidade, por exemplo, ele mostra de maneira bastante sutil a modernidade da metrópole que se inicia e se descortina por trás da neblina, na saída dos túneis, na construção de monumentos, nos edifícios que surgem por trás das árvores. Mas foi no estúdio que suas experimentações se tornaram mais evidentes na busca de uma imagem moderna. Brincadeiras com vidros, garrafas, reflexos e com o table-tops em que recria vários cenários e solta toda sua imaginação e vontade de construir imagens e desconcertar um olhar menos atento. O fazer fotográfico se incorpora à sua arte.

Seu mote parece ser o de surpreender. De tirar os observadores do confortável, criando um certo desconforto estilístico. Como se ele nos dissesse: "olhe! Aprenda a olhar!"

Nunca abandou nenhuma das linguagens e sua obra se transformou num belo acervo eclético. Naturezas-mortas passaram a conviver com experimentações abstratas. Desta forma podemos acompanhar de alguma maneira o próprio desenvolvimento das idéias do Foto Cine Clube Bandeirante.

Ao desfilarmos uma por uma suas fotografias, fica evidente que fronteiras ou limitações não serviam a sua busca, a sua vontade de criar. Tudo era pouco! E tanta era essa sua vontade que nos anos 50 abandona o Foto Cine Clube Bandeirante e com amigos também descontentes das linhas estilísticas adotadas por eles, monta o Grupo dos Seis. Foi lá, aliás, que ele trabalhou mais suas montagens, composições e os table-tops.

É certo que o tempo sempre acrescenta emoção às nossas experiências, mas foi já com emoção latente que Gaspar Gasparian fez suas imagens, sem pressa, sem cobrança, pelo puro prazer de registrar e de deixar para nós a memória de uma época, de um tempo que só seus olhos foram capazes de ver.

Por: Simonetta Persichetti
Jornalista/crítica de fotografia.